Quem nunca, em algum momento da vida, por pequeno que seja, não teve o mesmo desejo de Pippin, personagem representado por Felipe de Carolis? Quem não quer que algo aconteça na sua vida, que marque sua existência? Essa é só uma das questões reflexivas que o musical levanta, apesar de ser o tema central.
A procura do jovem rapaz pelo significado da vida me recorda muito o John (ou João na adaptação brasileira para o teatro e para o cinema), personagem de A Fera na Selva, de Henry James. Mas, diferente do personagem de James, Pippin não deixa sua vida escapar à espera desse acontecimento que vai marcá-la. Pippin experimenta, busca com mais afinco, ao contrário do outro. É uma busca com mais garra.
Com uma proposta lúdica o musical Pippin, que está em cartaz no Teatro Clara Nunes, no Shopping da Gávea até 21 de outubro, estrelado por Felipe de Carolis, Totia Meireles, Nicette Bruno e Jonas Bloch aborda temas que tira o espectador da órbita. O espetáculo brinca com o drama e a comédia, sendo tudo muito bem costurado e dosado de uma maneira que uma lado não pese mais em detrimento do outro.
Essa costura é feita pela MC, interpretada por Totia, uma atriz conhecida nesse meio e que dispensa apresentações. É ela a responsável por ajudar o nosso “herói” nessa busca pelo extraordinário, pelo evento que o fará único. A MC é impactante e genial, e evidencia muito bem o talento de Totia, que não interpreta uma simples personagem: além de cheia de camadas, a mestre de cerimônias evoca uma lembrança pessoal, já que foi a primeira peça que ela viu. Apesar de no final a MC demonstrar-se um pouco rude – assustadoramente cruel também – com o protagonista, essa sua postura é essencial para firmar a tomada de decisão que o próprio tem.
A parte humorística do musical é muito bem representado por Berthe, a avó de Pippin, personagem vivido, magistralmente, por Nicette Bruno (e por Catarina, vivida por Cristina Pompeo, não podemos esquecer). E é nessa parte, também, que temos o momento mais emocionante do espetáculo: a entrega da atriz é maravilhosamente envolvente. O conselho é dado ao neto ali no palco, mas serve para todos nós. Aliás, é dado a nós, como se Pippin nos representasse naquele palco. É, ainda, o número que mais conecta o público à peça.
Charles Möeller e Claudio Botelho fizeram um trabalho maravilhoso ao trazer para a peça situações atuais, usando e abusando da metalinguagem, transformando-a em um musical arrebatador, que não dá para ser descrito. Temos que vivê-lo. É uma experiência única. Não se trata de simples fábula que traz uma mensagem no final, é um convite a reflexão sobre a vida e nos mostra que a busca pelo extraordinário deve, sim, ser cuidadosa, mas que para isso, não devemos deixar de viver. Como próprio musical diz: “vai que a vida é só uma, vai se bagunçar depois a gente te arruma, vais sem pensar porque não tem talvez, viver é só uma vez”.
Se ainda não se convenceu de ir assistir o musical, deixo aqui mais um trecho:
“Vai viver, eu insisto.
Vai que eu tô vendo, vai por mim que eu assisto.
Olha pra mim, que em mim não tem talvez.
Vai longe, vai mais, enfrente o mundo.
Vai ser mistério, engole o mundo,
Viver é só uma vez”.
Resenha de: Arianne Marques
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